quinta-feira, 18 de março de 2010

AI DE TI, HAITI - TRAGÉDIAS DE UM POVO AMALDIÇOADO?

Paz e bem,

Em meio aos escombros, mal-cheiro e cadáveres, milhares de pessoas famintas, sedentas e desassistidas vagam sem rumo pelas ruas de Porto Príncipe, capital do Haiti. Cenas de violência são comuns, pessoas lutam, se matam e morrem por um pouco de comida e água.

Esta é a realidade que tem nos bombardeado diariamente nestes últimos dias. Não há como não se comover com as chocantes imagens da angústia humana sendo levada às suas últimas conseqüências. Até o momento em que escrevo estas linhas não chega a duzentos o número de vidas resgatadas de sob os escombros. Fala-se em mais de cem mil mortes, possivelmente ultrapassarão cento e cinqüenta mil, dizem alguns.

Neste ambiente de caos e miséria coletivos é impossível não nos questionarmos sobre Deus. Onde está Deus? Por que Ele permitiu tal tragédia? Há alguma lógica por trás disto?

As tragédias coletivas nos seduzem. Há muito mais pessoas inocentes morrendo de doenças infecciosas e degenerativas, de outras tragédias naturais que nos rodeiam, mas tais dados não nos chocam tanto. São difusos e esparsos. Um pouco aqui, outro ali... Mas as grandes tragédias são impactantes exatamente por atingirem muitas pessoas praticamente ao mesmo tempo. Lembram para nós o apocalipse bíblico, o dilúvio dos tempos de Noé, ou as tragédias que se bateram no Egito nos tempos do Êxodo e fazem muitos pensarem que semelhantemente a estas passagens das escrituras, Deus resolveu pesar a mão. Foi assim na época do Tsunami que devastou a Ásia, foi assim no 11 de setembro, não está sendo diferente na tragédia do Haiti.

Há poucos dias o cônsul-geral do Haiti em São Paulo, George Antoine, afirmou que a causa da tragédia poderia ser “de tanto mexer em macumba...”, completou que “o africano em si tem maldição...” e que “todo lugar que tem africano está f...”

Nesta mesma linha, o pastor estadunidense Pat Robertson afirmou que a causa das tragédias que assolam o Haiti seria devido a um “pacto com o diabo” supostamente feito por haitianos para se libertarem do domínio francês a cerca de 200 anos atrás. Além desta afirmação, o pastor coleciona outras pérolas, Pat Robertson também chegou a afirmar em 2006 que o então primeiro ministro Israel, Ariel Sharon, foi vítima de um AVC por castigo de Deus, por conta de seus esforços pela paz com os palestinos. Em 1985 usando uma matemática tortuosa ele defendeu que o genocídio dos habitantes de Canaã foi um ato de misericórdia de Deus para não super-popular o inferno.

O pastor Pat Robertson é muito popular nos Estados Unidos. Para se ter um idéia, ele concorreu contra George Bush, o pai, nas primárias do partido Republicano em 1988. Pois é, se você se entristeceu com os anos do clã Bush no poder, dê glórias a Deus, a coisa poderia ser pior, poderia ser com o Pat Robertson...

A dor só dói quando é conosco. É fácil condenar os outros, julgar, lançar pedras. Os amigos de Jó continuam se multiplicando.

O que vejo na Palavra é que tais especulações são totalmente descabidas.


Veja bem, há algo em comum nas tragédias naturais que, segundo a Bíblia, foram impostas por Deus. Em todas elas, aqueles que eram considerados povo protegido de Deus nada sofreu. Houve um grupo de pessoas que em meio à tragédia, foi poupado. Noé e sua família foram poupados e informados da tragédia por Deus. Assim foi também durante as pragas do Egito, ou até mesmo na preservação da prostitua Raabe e sua família, na queda dos muros de Jericó, e de Ló e sua família em Sodoma. Em todas elas Deus intercedeu diretamente em favor de um grupo de pessoas que tinham total consciência disso.


Há tal grupo no Haiti? Houve algum grupo que milagrosamente poupado possa dizer que recebeu um recado diretamente de Deus?

Não!

Portanto, não há nenhum paralelo entre esta tragédia e nenhuma outra que, segundo a Bíblia, tenha sido trazida pela mão pesada de Deus. O que vimos foi morte de todo tipo de pessoas, de todas as crenças, “macumbeiro”, segundo a classificação do cônsul, e pastores, passando pelos padres, humanitaristas e pessoas comuns. Independente de credo, cor, nação, idade. Morte aleatória, pura e simples. Fruto de um mundo que jaz no maligno. Fruto da miséria que nós impomos uns aos outros. Fruto do imponderável da vida onde o bem e o mal podem acontecer tanto ao perverso quanto ao justo.

Jesus teve esta mesma experiência. Conta-se que em sua época Pilatos, o mesmo que posteriormente iria crucificá-lo, massacrou um grupo de judeus dentro do templo e misturou o sangue destes ao dos animais que as vitimas estavam sacrificando em adoração a Deus. Na mesma época, caiu a Torre de Siloé, uma alta torre que guardava o arqueduto que levava água para o tanque de de mesmo nome, onde se cria que Deus curava a partir de um anjo que movia as águas. A tragédia soterrou dezoito pessoas.

Tais tragédias em locais ou situações que consideravam sagrados levavam o povo à inescapável sensação de que era a ira de Deus sobre aquelas pessoas. Pessoas mortas durante o ritual de fé ou em locais de fé sempre trazem consigo a suspeita de pecados ocultos que suscitariam a ira e a punição de Deus. Recentemente, por exemplo, um pastor morreu eletrocutado em um tanque de batismo e ouvi muita gente afirmando que podia ser a ira de Deus sobre algum possível pecado oculto dele.

A resposta de Jesus foi simples, como simples deveriam ser as nossas respostas ante tão grandes tragédias: “vocês pensam que estas pessoas são mais pecadoras do que as outras?”. O que Jesus nos alerta é que não importa a forma como vamos morrer, pode ser de velhice ou na flor da mocidade, pode ser em um desastre ou em um enfarte, pode ser tranqüila ou agonizante. O que importa não é a forma como a nossa vida vai terminar, mas o que fazemos com ela enquanto estivemos aqui.

Tragédias como a do Haiti vão continuar acontecendo, mas em todos os casos lancemos sobre eles o olhar de misericórdia que gostaríamos que lançassem para nós. Que saibamos que eles não são mais pecadores do que nós e que se Deus fosse nos julgar de acordo com nossos méritos humanos, nenhum de nós escaparia e haveria um terremoto para cada habitante deste planeta.



O povo do Haiti é um povo sofrido vítima de erros históricos que o fez o país mais miserável das Américas, mesmo antes do terremoto. Vítima do gemido da natureza de um país pousado sobre placas tectônicas. Vítima de um mundo eu nunca viveu plenamente a solidariedade. Não o façamos também padecer como se fosse mais culpado do que os outros povos deste mundo que jaz no maligno. Não estendamos sobre eles, além das dores do sofrimento que já carregam, as dores da exclusão, como se fossem triplamente amaldiçoados por Deus, por serem negros, por serem do Haiti e por sua religião.

Eles não são nem nunca foram mais pecadores que nenhum outro povo que já pisou esta terra. Não são mais pecadores que eu ou você. São apenas pessoas humildes que passaram por tragédias e estão necessitando sobreviver, assim como nossas crianças desamparadas, nossos moradores de rua, nossos excluídos e sofridos de todos os lugares deste planeta.

Ore pelo Haiti e se puder fazer mais, faça! Não com jactância, nem com olhar de superioridade, mas entendendo que neste mundo caído nenhum de nós está escape de em algum momento ter de enfrentar tragédias e terremotos, sejam eles figurados ou reais, na nossa própria vida.


Extraído
Ministério Fruto do Espírito

Nenhum comentário:

Postar um comentário