sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

CULTURA E ARTE EVANGÉLICAS?

Quero aqui postar uma materia de um grande jornalista Eudes Oliveira onde publicou um assunto relevante para nossos dias.

CULTURA E ARTE EVANGÉLICAS?

Leio com certo desconforto, aqui mesmo neste jornal (reportagem do dia 10/11/08), que a deputada evangélica Eliziane Gama (PPS), defendeu com bastante veemência, ante seus pares e na presença do Secretário de Cultura do Estado, o senhor Joãozinho Ribeiro, que os evangélicos devem também receber parte dos recursos que serão destinados ao carnaval, como forma de promover os retiros que realizam no mesmo período. Em suas próprias palavras: “Não seria justo o recurso orçado em até R$ 10 milhões para investimento de carnaval do Estado, e nada desse mesmo recurso ser utilizado nas manifestações de carnaval evangélicas”. Eis uma coisa que eu não sabia, que os retiros são uma espécie de carnaval. Incrível, nos vinte e tantos anos de vivência evangélica e uns tantos retiros nas costas, nunca me dei conta de que eram carnavais!

Há algo de muito errado no argumento da nobre deputada. Sei de movimentos evangelísticos durante o carnaval. Sei de blocos, isso mesmo, blocos carnavalescos evangélicos. Não sei se ainda existem, mas desfilaram na festa de Momo e enquanto o faziam, os dois representantes, um no Rio e outro em Curitiba, evangelizavam. Esta pelo menos, naquele momento, era a intenção.

Mas retiro-carnaval parece-me uma argumentação um tanto forçada, isto para não dizer totalmente equivocada. Até onde sei, eles se prestam para buscar momentos de intimidade com Deus, compartilhar alguns dias em comunidade com outros irmãos, descansar, participar de estudos bíblicos e coisas do gênero. É verdade, acontecem brincadeiras, esquetes, apresentações musicais, mas daí a requerer que estes momentos reservados de uma igreja seja uma demanda legítima para angariar fundos estatais para subvencioná-los como arte, vai uma longa distância.

O que seria arte evangélica? As manifestações musicais? Não há dúvida: a igreja é um celeiro de bons músicos, as orquestras e bandas populares estão cheias deles. Mas tem seu próprio mercado e até onde se sabe, vai muito bem, não digo na qualidade dos produtos. O teatro? Qual a peça evangélica que se destacou no último ano pelas suas qualidades técnicas, cênicas, etc?

Sim, qual arte é evangélica? Aqueles arremedos coreográficos que acompanham uma ou outra apresentação ou louvores em algumas igrejas? Tenha santa paciência. Que mais? Na pintura, na escultura, quem se diz evangélico e realiza tal arte assim chamada? Não há. Parece que a arte recusa-se a receber rótulos. A ruim não vinga e a boa, realizada por alguém de talento, qualquer que seja o tema que aborde, impõe-se sem precisar de adjutórios estatais. A boa arte, qualificada pelos seus próprios méritos de beleza, refinação estética, criatividade, esta sim, merece apoio e não precisa carregar um rótulo meritório que lhe dê dignidade, muito menos evangélico.

Temo pelo mau costume, pelo oportunismo, pelo critério que pode ocorrer de que alguém, por ser “artista” evangélico, faça jus a recursos públicos, algo como um sistema de cotas. Nada hoje se faz sem que o estado (municipal ou estadual) ponha a mão, digo, dinheiro e no final cada uma destas atividades são absolutamente inócuas em termos de impacto social/espiritual, apenas representa uma espécie de deleite pelos músculos que a igreja tem. É o gozo narcísico diante do espelho/multidão. Temo pela cumplicidade e promiscuidade que isso geraria (gera) com o estado. Temo pela perda de relevância e pertinência – já aconteceu, ou não?

Em sua fala, a insigne deputada menciona que “A cultura, em alguns momentos, converge com a religião”. Menciona o Tambor de Mina, a Festa do Divino em Alcântara. Então é isso? Se me permitem e impertinência, qual das igrejas evangélicas maranhenses, em suas manifestações, digamos, culturais como quer a deputada, merece equiparar-se às festas mencionadas? Não me ocorre que qualquer de nossas manifestações, que não ouso chamá-las de culturais, se qualifique e mereça o mesmo tratamento. Aliás, os evangélicos querem ser tombados? Ser participantes do patrimônio imemorial cultural do estado do Maranhão? Os argumentos apresentados sofrem de alguma confusão entre o que é arte e/ou cultura e ainda, qual a missão da igreja.

Não é de hoje, porém, que se discute o que seja arte. Sobre cultura, há relativa concordância. Mas pode ser que a deputada esteja falando de uma arte duchampiana. Em 1917, Marcel Duchamps, enviou sua “obra”, um urinol, ao qual intitulou “Fonte”, para a Associação de Artistas Independentes de Nova Iorque. Claro que causou espanto. Um urinol, arte? O artista defendia a ruptura completa com o padrão da época. Ninguém lhe diria que sua arte era arte, ele mesmo o faria, dando significado ao que não tinha. Pasmem: o urinol moldou nossa arte até hoje, daí porque o salão de arte moderna de São Paulo, este ano, tem uma ala inteira vazia, como vazia é a cabeça de seus perpetradores.

Sugiro à deputada a leitura de um clássico, “A Morte da razão”, do teólogo cristão Francis Schaeffer. A obra trata de arte e cultura no século XX e explica como o mundo ocidental se suicidou com atitudes como a de Duchamps e outros tantos, nas mais diversas áreas artísticas.

A proposta da deputada, entretanto, se reverte de problemas práticos e perigosos. Supondo que os retiros estejam recheados de arte de todo tipo, quem vai receber os recursos? Isto na casualidade do governo sentir-se chantageado pelo politicamente correto, que o obriga a agradar gregos e baianos. Pela mão de quem os recursos chegarão aos artistas que se amontoam escondidos em sítios, colégios, chácaras e outros que tais?

A Arte não deveria ser compartilhada com a comunidade? Na passarela do samba de triste figura? A deputada demonstrou preocupação porque estes eventos artísticos evangélicos acontecem no mesmo período do carnaval e por isso não recebe “destaque”. Não seria o caso, sugiro, de se fazer um carnaval evangélico fora de época? Antes da sexta-feira santa, por favor, assim temos tempo para uma quaresminha e que não falte uma quarta-feira de cinzas para expiar os excessos de arte.

Excelentíssima senhora deputada, com certeza, há causas mais nobres e necessitadas de quem as adote com desprendimento, alegria, e verdadeiro sentido de serviço que os políticos teimam em esquecer, porque quando o fazem, há que ter algum tipo de “lucro” diante do eleitorado.

É para dar crédito à iniciativa da deputada? A própria crê mesmo no que defende? Se acreditar, temo pela falta de rumo de seu mandato, se não, bom, melhor nem falar. O fato é que este fuzuê com a defesa de uma suposta cultura ou arte evangélica é triste, tanto mais porque, certamente, a manifestação do Reino pede outro tipo de investimento que não passa, de jeito nenhum, pela subvenção do estado, nem por aqueles que se dizem cristãos.

Sua preocupação com a Constituição é boa, mas esta não é a maior das dificuldades, sequer se nomeia entre os problemas de sua “cruzada”, posto que represente apenas um grande e monumental equívoco que é no que a maioria dos políticos cristãos se transformam neste país. Isto, sim, é o grande problema.



Jornal Pequeno
17 de novembro de 2008
Eudes Oliveira de Alencar

3 comentários:

  1. Retiro-carnaval , é uma argumentação mais que forçada ,equivocadérrrrrrima! Sendo que a própria palavra já diz–>carnaval'carne vale'[vale tudo!], e é justamente o que a igreja não busca....

    ResponderExcluir
  2. obrigado pelo comentario, você tem razão, abraços e fique na Paz

    ResponderExcluir
  3. car na val festa da carne , retiro de carnaval é sair do meio imundo da carne é um contra ponto e dinheiro para igreja já basta o que Deus estabeleceu, que muitas coisas nas igrejas sáo verdadeiros carnavais eu também concordo, mas o cristianismo é muito sério e náo mulecagem de certos muleques

    ResponderExcluir